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Writer's pictureKatherina Cordás

Um eterno desconforto, “a la Madame Bovary

Escuto muito dizer que venho de uma geração de insatisfeitos. Uma geração que se cansa rápido das coisas, que não aguenta frustrações e busca sempre o satisfatório em primeiro lugar. O karma da geração Y. Talvez seja verdade. Tenho diversos amigos que casaram, com direito a festa, vestido e buffet e, em pouquíssimo tempo, se separaram, afinal, passou a emoção, o frio na barriga. Imperou a rotina. Quem se apaixona pela rotina? Algo parecido acontece com a profissão, o trabalho, estilo de vida… Será que nossos antepassados também não se cansavam da rotina mas, apenas, iam na onda do comprometimento e viviam o que se dispuseram com "até que a morte os separe"? Estavam certos eles? Devemos nos conformar com uma eterna mediocridade monótona ou, devemos, de fato, buscar o intangível êxtase da instabilidade eletrizante? Vivemos um eterno desconforto “a la Madame Bovary”, decepcionada com ilusões criadas por ela mesma? Imersa nessa geração me abstenho da resposta. A questão é, Flaubert falou disso há quase 200 anos, mas este retrato de um insaciável ensimesmamento é cada vez mais atual.


O curta-metragem "Próximo Piso" (Next Floor), de 2008 do canadense Denis Villeneuve, retrata um pouco isso. Em um absurdo banquete quase ritualístico, grotesco e alegórico, comensais esganados, envolvidos em uma gula intensa, glutônica e autocentrada, são incapazes de empatia, de movimento, de realização, mesmo em meio a um agressivo declínio de seu entorno.


Claro, o filme trata esse tema de forma bastante surrealista e exacerbada em prol da dramaturgia. Mas, principalmente hoje, devemos nos lembrar de olhar ao redor. Temos a chance (ou obrigação) de pensar no entorno, no próximo, no ambiente. Será que, quando tudo isso passar e o senso de pânico e coletivismo forem esquecidos, vamos continuar buscando incessantemente a satisfação pessoal de forma tão individualista e gananciosa? Temos uma oportunidade aqui, agora, de um olhar macro, de uma pausa para rever, antes de tudo, nossos próprios umbigos (ou como disse @antonioprata "nossos próprios narizes"). De repensar a tamanha gula pelo consumo desenfreado e pela satisfação a qualquer custo, antes que cavemos, de maneira literal, nosso próprio declínio.




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